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A inquietação como matéria-prima
redoma - A inquietação como matéria-prima

© Pedro Ivan

Há discos que espelham diferentes camadas, umas mais nítidas e outras com mais neblina. “santos da minha mente”, o álbum de estreia, acabado de lançar, da dupla portuense redoma, que será apresentado a 17 de abril, no Maus Hábitos, é exatamente isso: uma travessia feita de fé sem fé, de inquietações mentais e existenciais, de versos que se escrevem a partir do caos interior e das vivências mútuas. 

Joana Rodrigues e Carolina Viana (a.k.a. MALVA) começaram a desenhar este percurso em 2022, depois de lançarem o EP “parte”. Nessa altura não sabiam, ainda, que iam fazer um álbum, mas sabiam que queriam continuar juntas. “Fomos desaguando essas inquietações e purgando de alguma forma”, conta Carolina. “Não tínhamos o objetivo claro de um disco longo, mas tínhamos a vontade.” Joana completa: “Fomos deixando que as coisas aparecessem, a um ritmo próprio, sem pressa. Só no final percebemos que tínhamos, de facto, um longa-duração”. 

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Joana Rodrigues e Carolina Viana © Pedro Ivan

"santos da minha mente"

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Capa do álbum "santos da minha mente" © Diana Gil

O disco tem nome de oração, mas contém mais dúvidas do que dogmas. “Os santos são pensamentos paradoxais e angustiantes. Ideias que vivem cá dentro, muitas vezes controversas, que se picam e que chocam”, explicam. São essas figuras mentais resguardadas em redomas, não para as silenciar, mas para lhes dar espaço – “Para que repousem numa fé que as acalme”. Este álbum, afinal, “é sobre aceitar que somos um poço de contradições, e não aceitar isso pode trazer ainda mais inquietações.” 


Cada faixa funciona como uma pequena cápsula de mundo. Há uma atmosfera própria em cada uma, mas todas se ligam — por palavras, por texturas sonoras, por pequenas repetições escondidas no som. “Há muitos instrumentais e samples que se repetem, mesmo que não de forma óbvia”, diz Joana, responsável pela produção. “Queríamos essa sensação de continuidade”. Carolina vê o disco como uma viagem circular, uma narrativa com início e fim, mas que permite regressos: “Se voltares atrás, percebes outras camadas.” 

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Contracapa do álbum "santos da minha mente" © Diana Gil

A construção do álbum foi feita a quatro mãos, mas em dois mundos — Carolina escreve as letras e a Joana produz os instrumentais. E só depois, no estúdio, é que começam a atravessar os campos uma da outra, procurando o ponto de encontro entre o que se diz e o que se escuta. “A Carolina começa a estruturar a letra e isso molda o instrumental”, explica Joana. “É aí que a produção começa a responder ao que está a ser dito.” 


E o que se diz em “santos da minha mente” não é pouco. As letras são matéria viva, poética. Versos como “preferia ter-me na mão e não ser a mão que não existia” (em santos da minha mente) ou “sofro delírios mensais, delitos mentais que antecipam um jorro fatal” (em delírios mensais) atravessam o corpo em versos desconcertantes com várias camadas de sentido.  

Questionada sobre a frontalidade com que aborda o íntimo, Carolina responde quase sem hesitar: “É natural. Nem penso nisso assim. É só a forma como eu olho para o corpo e para essas questões. E faz-me sentido.” Ainda que, como reconhecem, esse dizer também tenha camadas e subtilezas. “Nunca nos sentimos na obrigação de filtrar as coisas que dizemos. O jogo da subtileza é parte da nossa forma de comunicar. Mas dizemos tudo o que queremos dizer — só que da nossa maneira.” 


Esse “nós” que Carolina usa não é descuido. redoma é um projeto de um “eu plural”. As inquietações de uma, são também as da outra. E mesmo quando a letra nasce de uma experiência pessoal, a partilha é constante: “Antes de fazermos música, já éramos muito próximas. As temáticas vão-se discutindo entre nós. E, por isso, é natural que sejam nossas, assim como quando são ouvidas por outras pessoas também sejam um pouco delas.” 


Há um “nós” maior que o disco convoca — um “nós” coletivo, comunitário, social. A cidade, por exemplo, está lá, mesmo quando não é nomeada. “O Porto é um parque de diversões”, diz Carolina. “Temos um grande amor pela cidade, inspira-nos em várias dimensões, tanto pela beleza como pelas pessoas, mas a transformação da cidade assusta-nos.” Joana completa: “É contraditório. Adoramos viver aqui, mas sabemos que são tempos difíceis. A habitação, os hotéis, a transformação constante… tudo isso cria essa nuvem cinzenta que atravessa o álbum.”

Escutar ao vivo 

As redoma vão apresentar o álbum “santos da minha mente” no dia 17 de abril no Maus Hábitos. Para esta apresentação, trazem reforços: João Pedro Dias, trompetista que participou na música “fuligem”, junta-se em palco para explorar texturas ao vivo; e Diana Gil, responsável pelo design do álbum, estará em palco a criar visuais. “Queremos que seja um ritual de passagem”, explicam, “por isso também vamos levar ainda resquícios do EP ‘parte’”. 


No final desta travessia, perguntamos se encontraram, enfim, o tal repouso. “Sim, estou fixe”, diz Carolina, a sorrir. “A purga aconteceu. Foi expelida. Agora estamos bem. À espera das próximas inquietações.” Joana ri e acrescenta: “Agora vamos abrir a redoma para o exterior. —  Num voo alto, que começou cá dentro. Enfim o ‘sossego’”.

redoma - A inquietação como matéria-prima

 © Diana Gil

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