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Quem conta o Porto acrescenta um ponto
Alcide Gonçalves e a flor de inverno
Porto, a cidade das camélias
Quem Conta o Porto mar 2025

© Rui Meireles

No Porto, há uma flor que é rainha no inverno. Enquanto a maioria das árvores deixa cair as suas folhas e as flores estão mais escondidas, a camélia aparece em cores vibrantes, como se antecipasse a primavera. “A camélia floresce numa época em que a restante vegetação está mais triste. Muitas árvores estão despidas, sem as suas folhas, e a camélia vem para embelezar os jardins da cidade”, descreve Alcide Gonçalves, arquiteta paisagista e conhecedora deste património natural, que conduz, frequentemente, visitas guiadas pelos jardins históricos do Porto, para dar a conhecer as histórias que florescem entre as pétalas e as raízes destas árvores.

Porto, a cidade das camélias

Hoje, podem ser observadas inúmeras espécies com diferentes características por toda a cidade. “Temos este património de camélias devido, talvez, aos colecionadores que se apaixonaram por esta flor, e isso continua a ser um movimento mundial.” Desde o século XIX, quando os primeiros exemplares começaram a ser cultivados em alguns jardins portuenses, a cidade assumiu um fascínio por esta espécie vinda do Oriente, conferindo ao Porto o título de “cidade das camélias”.



No âmbito da sua atividade profissional, como arquiteta paisagista, Alcide define-a bem. “Para além da sua beleza, a camélia é uma planta que se adapta na perfeição aos espaços; costumo dizer que é competente, porque ela cumpre bem a função que lhe é atribuída.

E, ainda por cima, floresce numa época diferente das outras plantas. É a natureza que constrói tudo isto, e isso fascina-me.”

Quem Conta o Porto mar 2025

Alcide Gonçalves © Rui Meireles

Quem Conta o Porto mar 2025

© Rui Meireles

Os Jardins do Palácio de Cristal, o Jardim de São Lázaro, o Jardim Botânico ou a Casa Tait, entre outros, guardam uma coleção viva que continua a surpreender. “A Casa Tait tem uma coleção impressionante, com mais de 60 variedades, e há uma espécie que se destaca: a Princesa Real, a camélia

preferida de Muriel Tait, a última habitante da família Tait a residir na casa.”


A relação do Porto com as camélias não é apenas uma questão de paisagem. A flor faz parte da memória coletiva das pessoas, sendo presença nos jardins antigos e recônditos. “As pessoas vêm ter comigo e dizem: ‘a minha avó tinha esta camélia no jardim!’. É uma flor que transporta memórias e que liga gerações.”

29.ª Exposição de Camélias do Porto

Março é o mês das camélias. O primeiro fim-de-semana do mês é dedicado à rainha das flores de inverno, numa exposição que tem lugar no Parque de São Roque e que junta colecionadores, produtores e curiosos numa celebração que vai além da botânica. “É um encontro que atravessa continentes! Há quem viaje milhares de quilómetros só para ver estas flores”, conta Alcide. Parte do encanto da camélia está na sua diversidade. Nenhuma flor é exatamente igual à outra. “Muitas vezes encontramos camélias com pétalas matizadas, como se a natureza estivesse a brincar com as cores.”


O programa do certame estende-se a toda a família com oficinas para os mais novos. A programação completa pode ser consultada em agoraporto.pt.

Quem Conta o Porto mar 2025

© Rui Meireles

Percurso interior através da flor

O encanto das camélias não está apenas na sua resistência ou nas suas cores vibrantes. Para Alcide, é algo mais profundo. Nos seus workshops, desafia os participantes a desacelerar, a perceberem que o silêncio faz parte da beleza. “Quando observamos uma camélia, mesmo que seja uma flor simples, somos obrigados a parar. E isso já é um gesto poético.” Talvez por isso a arquiteta se tenha deixado seduzir pelo Ikebana, a arte japonesa de arranjos florais. “O Ikebana é chamado ‘o caminho das flores’. É uma prática ancestral que liga o coração humano ao coração da planta.” Nas suas oficinas, Alcide tenta transmitir esta filosofia, mas nota uma diferença cultural: “As pessoas têm muita pressa em pôr as flores rapidamente para chegarem ao resultado final. Mas o Ikebana não é isso; é equilíbrio, é vazio, e o vazio, para nós, ocidentais, é difícil de aceitar. E o equilíbrio também não significa simetria; pelo contrário, o equilíbrio muitas vezes é assimétrico.”

Quem Conta o Porto mar 2025

© Rui Meireles

Quem Conta o Porto mar 2025

© Rui Meireles

Os caminhos floridos da cidade

Guiar percursos pela cidade é, para Alcide, mais do que mostrar lugares – é revelar segredos. “A árvore não é estática. Mesmo sem vento, ela move-se, cresce, adapta-se e procura a luz. E nós podemos ver isso nos troncos, na direção dos ramos, na forma como a planta se ajusta ao espaço que a rodeia.


” Nos passeios que conduz, os participantes descobrem mais do que a botânica. “Lembramos às pessoas a importância destes espaços, porque as árvores não são só árvores; são testemunhas do tempo, são pontos de referência das nossas vidas.”


Alcide quer continuar a divulgar este património, lembrando que, no Porto, a camélia é mais do que uma flor – é uma herança viva. “O meu objetivo é fazer com que as pessoas conheçam e valorizem estas flores incríveis. Porque o que é belo, merece ser celebrado.”

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