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João Ricardo Pateiro chega num Peugeot 106 clássico e, ainda antes de estacionar, não é deixada margem para dúvidas: o pequeno carro vermelho está coberto com vinis autocolantes mostrando grandes microfones, nomes de programas e diversas frequências da TSF. A voz emblemática de João Ricardo Pateiro instalou-se durante 27 anos naquelas ondas de rádio, fazendo do relato desportivo uma forma de arte. O êxtase de um golo num jogo de futebol era amplificado e cristalizado por um “Goloooooooo!” sustido até ao limite do humanamente possível — e, em casos de golos e jogadores especiais, seguido de uma pequena canção trauteada durante os festejos dentro e fora de campo.
Entretanto, Pateiro abraçou novos desafios profissionais, mas à data da nossa conversa com ele, aquele carro e aquele papel ainda eram os seus. Estacionam em frente à Casa do Vintage, local escolhido a dedo por João e notoriamente não por acaso. Além da amizade que o liga aos donos da loja, confessa um hábito de colecionar pequenos objetos nestas lojas da especialidade. Até porque a nostalgia é, para Pateiro, quase uma vocação: com o jornalista Carlos Daniel e o músico Filipe Fonseca constituiu a banda “Tertúlia dos 40”, reconhecida por cantar medleys de canções portuguesas de outras décadas, jingles televisivos familiares e outros elementos da memória coletiva.
A única canção original desta banda é “Leva-me à Baixa”, uma homenagem à renovada vida noturna do centro histórico do Porto. E esta dimensão de vida noturna acaba por facilitar a João uma metáfora sobre o que o atrai no Porto: “Eu acho que o Porto é um pub. Enquanto, por exemplo, vejo Lisboa mais como uma discoteca, o Porto tem uma coisa mais intimista, mais à pele, com mais sentimento.” E este é um sentimento mais compassado, segundo o radialista: “Vejo o Porto como uma coisa que nos leva mais à meditação, que nos leva a estar, a permanecer. O Porto convida a estar e não ter pressa.”
Essa falta de pressa parecia impor-se, mesmo em hora de ponta: “Quando a TSF era em Gonçalo Cristóvão, na Baixa do Porto, em vez de apanhar a VCI, eu descia os Aliados e conduzia por outro percurso. Chegava a Mouzinho da Silveira, depois zona da Ribeira, cortava à direita e fazia todo o percurso até Matosinhos, passando pela Alfândega, até chegar à Lavra, que é onde eu moro. Fazia isto porque acho que é relaxante aquilo, é quase uma massagem à cabeça.”
Esta evocação de lugares e deambulações faz despertar a voz, e João Pateiro lança-se num canto de “Porto Sentido”, de Rui Veloso, em jeito de relato de futebol. Mas isso não é para ler, é para ouvir no vídeo já aqui em baixo.
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