«Inimigo da paisagem
On devine en lisant, on crée; tout part d’une erreur initiale.
Marcel Proust
Há uma obra de Fernando Marques de Oliveira que inclui a frase "inimigo da paisagem". Curiosa afirmação, esta, cujo sujeito é indefinido, facto que cria desde logo uma tensão linguística, a qual contamina a plasticidade do trabalho. Será o autor contra aquele género artístico? Ou poderemos antes ler aquele curto texto como um comentário ao modo como o humano tem tratado a natureza por si edificada? A minha resposta evita ambas as perguntas, pois, creio, ser possível ler o pequeno escrito como um aforismo ou, melhor ainda, como um fragmento de um verso transcrito a partir de uma estela grega — penso sobretudo em Arquíloco, que, no século VII a.C., escreveu: "…. Sei uma coisa muito importante:/ a quem me faz mal, respondo-lhe com terríveis ofensas."
Nesta exposição reúnem-se cinco décadas da produção de Fernando Marques de Oliveira, homem culto, dandy, gentleman, aristocrata, amante das coisas boas da vida. Ouvinte de música clássica e jazz, leitor de poesia — Cavafy, Ferlinghetti –, filosofia – Santo Agostinho —, prosa — Paul Bowles, o artista é sobretudo um proustiano, sendo "Em busca do tempo perdido", na versão traduzida por Pedro Tamen, o seu livro de cabeceira.
Estas dimensões que caracterizam o seu modo de ser e estar na vida, transparecem na sua obra, mesmo nos momentos em que ela procura ocultar, através do uso do negro, geometrizado ou orgânico, aspectos relacionados com a composição formal dos trabalhos que produz. Fernando Marques de Oliveira tem a sua "maneira negra", de traduzir as suas vivências, a sua inspiração, porque nem tudo é luz no processo de criação, sendo este por vezes atravessado pelas mais profundas dores...
Óscar Faria
Novembro 2024 »