O luar corta toda a rua em sombras geométricas numa saturação azul e profunda. As pedras toscas que se estendem ao longo do quarteirão são ladeadas por portões familiares, sujos de grafitti. Há um cheiro açucarado no ar muito próprio das noites convidativas de entrudo na cidade, do vinho espalhado nos passeios. O tipo de cheiro que só se consegue sentir em contextos muito específicos, no dia de um nascimento importante, e em algumas madeiras doces. Ao longe, uma série de vozes indistintas ritmam a noite, provenientes de uma estação de comboios lá muito ao fundo, de luzes amarelas e macias.
À Filha da Cvlto é dado o nome de Judite, que na nossa história portuense degola desde o seu nascimento os vários holifernes desta cidade sem temores e causando tremores. No ano de sexto aniversário da progenitora abrem-se os portões de ferro e as paredes de pedra à cerveja, ao fumo em cornucópias e aos cabelos coloridos eriçados, aos picos e aos bicos, às biqueiras e bebedeiras, aos gritos e sorrisos, aos novos e aos velhos mal (bem) comportados. Um brinde a mais um baile dos infernos.